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Como medida para erradicar o mau cheiro e a sujeira das ruas, Vespasiano – que governou o Império Romano durante dez anos (69-79 d.C.) – ordenou a construção de mictórios públicos. E decidiu cobrar tributos dos usuários. Contestado por seu filho, Tito, sobre a cobrança de tal atividade, o imperador proferiu: pecunia non olet. Ou seja: tributo não tem cheiro.

A máxima é hoje princípio consagrado no Direito Tributário. Para o Estado, não importa a origem, o tributo deve incidir sobre todas as atividades, mesmo as ilícitas ou imorais. Assim, a expressão é frequente entre os auditores fiscais e serve de contraponto ao momento enfrentado pelo funcionalismo público: assim como tributo não tem cheiro, nosso inimigo também não tem (nem nunca teve) cor.

Quando atacados, não fazemos distinção se a ameaça é vermelha, azul ou verde-oliva. O que nos resta é nos defendermos em busca da manutenção da sobrevivência de nossas atividades e da construção de um país mais justo. Uma entidade de classe não possui inimigos a priori. Pelo contrário, existimos justamente para a criação de pontes, para o estabelecimento do diálogo equilibrado em busca de soluções e caminhos para a transformação e evolução constante de nosso segmento – sem perder de vista nossa contribuição à sociedade.

A Unafisco Nacional completa em 2020 cinquenta anos de existência. Passamos (e iremos passar) por diversos governos e não esmorecemos nem por um segundo em nossos propósitos. Atualmente, é nítido que fomos escolhidos como alvos. O inimigo nos escolheu em repetidas declarações e manifestações contra os servidores públicos, que foram desfechadas neste primeiro ano de governo Bolsonaro. É preciso mostrar a face daqueles que querem nos destruir: são ataques vindos principalmente do Ministro da Economia, e também do Presidente da República e do Presidente da Câmara dos Deputados.

O Presidente da República, que já afirmou que colocaria em “extinção o quadro de fiscais no Brasil”, deu demonstrações de apoio ao Ministro Paulo Guedes nas recentes ofensas – e acelerou a passos largos a Reforma Administrativa – ao invés de promover o debate sobre as propostas.

Tratando da Reforma Administrativa (ferozmente defendida pelo Deputado Rodrigo Maia, Presidente da Câmara dos Deputados), mesmo que as medidas sejam aplicadas somente aos novos servidores devemos apontar suas nocividades: redução em 25% dos salários, diminuição da jornada de trabalho, fim da estabilidade, congelamento de promoções e progressões e não realização de concursos públicos – ações que encaminham o país para a destruição de condições mínimas de funcionamento do serviço público.

Ademais, especificamente no caso da Receita Federal, temos o desrespeito ao artigo 37, inciso XXII da Constituição, que dá preferência no orçamento à administração tributária, com a proposta de redução em 36%: de 2,8 bilhões para 1,8 bilhões de reais – mesmo valor nominal de 12 anos atrás. São ações que enfraquecem e desvalorizam toda a categoria e o órgão da administração tributária federal, para o qual dedicamos os melhores anos de nossas vidas em sua edificação, além de dificultar a realização da justiça fiscal em benefício de toda a sociedade.

As propostas simploriamente reducionistas não se baseiam em dados e se desviam dos verdadeiros problemas. Algumas das falácias são desmistificadas pelo estudo “O Lugar do Funcionalismo Estadual e Municipal no Setor Público Nacional”, da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público em parceria com o Fonacate. O emprego público não cresce de forma desenfreada: o gasto em relação ao PIB se mantém estável há décadas. Além disso, dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontam o Brasil na 26ª posição em tamanho do serviço público, com apenas 12% da população nessa atividade contra os 23,5% do Reino Unido, 17% da África do Sul e 16% de Portugal.

Por tudo isso, reforçamos a convocação para as manifestações do dia 18 de março. Foi aprovada em assembleia geral do Sindifisco Nacional a participação dos auditores fiscais da Receita Federal em ato de mobilização nesse dia.

É tempo de nos defendermos. A chamada que fazemos aos auditores é a mesma que qualquer pessoa de bom senso faria a um estudante que sofre bullying na escola: se você não se defender, eles não irão parar de te perseguir! Partir para as paralisações, manifestações e outros eventos não significa queimar pontes para o diálogo. Pelo contrário, as portas para o diálogo seguem abertas. Mas, diálogo pressupõe respeito e ninguém respeita os que silenciam e se omitem diante da adversidade. 

Vamos mostrar nossa reação, não pela cor da bandeira ou ideologia do inimigo, mas por suas intenções em nos aniquilar. A escolha está posta: é lutar ou ser extinto enquanto categoria; é lutar ou continuar perdendo direitos e a condição de sustento de nossas famílias.