A programação do primeiro dia 5ª edição do Congresso Luso-Brasileiro de Auditores Fiscais, realizado em 13/10, foi encerrada com duas palestras magnas. O professor Vasco António Branco Guimarães, doutor em Direito Financeiro e Tributário, apresentou panorama sobre a relação do cidadão com os impostos. O senador Antonio Anastasia (PSD/MG) abordou o contexto da política tributária no Brasil.

O professor Vasco Branco Guimarães fez uma explanação didática, visando definir a relação da tributação com o cidadão comum. Para ele, esse esclarecimento é uma necessidade fundamental da administração pública, pois sem isso a população não entende o propósito de suas contribuições e fica em uma condição de constante desconfiança, gerando uma crise permanente para o Estado, que fica sem “legitimidade social e humana.” “O Estado tem que saber onde põe, como põe e como é que está a redistribuir aquilo que se apropria. Quando o Estado consegue fazer isso, consegue atingir o seu objetivo de cidadania. Quando não consegue fazer isso, é um Estado em crise.”

Vasco Guimarães explica, em linhas gerais, que o imposto é uma “amputação patrimonial legítima”, pois é algo validado pela legislação e pela estrutura democrática. Entretanto, “a leitura pictórica é de que quem sofre a amputação fica mais pobre. O Estado acumula e não existe a expectativa de haver redistribuição.” Ele aponta que a relação das pessoas com os recursos financeiros está ligada primeiramente à necessidade de sobrevivência, de atender a necessidades imediatas. “Quando se resolvem as questões da sobrevivência do ser humano, há uma segunda dimensão que é muito importante também, que é a dimensão da segurança. Ao ser humano não basta comer, é preciso ter um mínimo de perspectiva de futuro. A civilidade começa quando chegou-se ao nível da segurança.”

Segundo o professor, ao atingir condições consideradas de segurança, com estabilidade, possibilidade de realizar investimentos e percepção de que há um retorno dos impostos na forma de serviços providos pelo Estado, é possível chegar a um patamar de “solidariedade”, em que há uma consciência da importância de contribuir. “Isto aqui é o que eu chamo de dificuldade endêmica, originária, do imposto. O imposto funciona como uma fonte de agressão para a sobrevivência, para a segurança. Só não é na fase da solidariedade, quando tudo isso já está ultrapassado. Ultrapassar isto é com educação, com rigor, com transparência. É retorno: seus filhos podem estudar em uma universidade pública, você vai para o hospital e é tratado. Há materialização no dinheiro que é transformado em impostos apropriados.”

O senador Antonio Anastasia trouxe uma perspectiva da política brasileira sobre a relação do imposto e o combate à desigualdade. Para ele, o País ainda não está preparado para um patamar em que a política tributária promova combate à desigualdade porque “nós temos no quadro brasileiro, não só na questão tributária, mas em diversas outras áreas, uma grande indagação sobre a nossa capacidade institucional.” Nisso ele ilustra que há várias décadas é debatida a reforma tributária, mas que os projetos nunca são levados adiante. Para o senador, um grande entrave é que sempre é colocada em xeque a autonomia dos entes federativos, Estados e municípios, de resolução complexa. “O primeiro grande desafio é compormos uma reforma tributária que proteja e preserve a natureza federativa.”

Outro grande problema, segundo Anastasia, é a necessidade de superar a insegurança jurídica da atual legislação. Sucessivas leis que remendam detalhes das questões tributárias e levam a interpretações diversas por parte do Judiciário deixam “a todas as partes [contribuintes e Estado] uma absoluta instabilidade. Onde há instabilidade não pode haver planejamento. Onde não há planejamento, como nós vamos ter diminuição das desigualdades? Como poderia o poder público atuar na redução das desigualdades sociais e regionais sem que o Estado tenha condições de fazer um planejamento mínimo?” Ele afirma ainda que o próprio setor privado divulga seu planejamento tributário e de investimentos porque ele está “à mercê de uma alteração brusca de entendimento.”

O senador Anastasia concluiu a programação do primeiro dia do congresso com uma fala de cunho otimista e de valorização das instituições tributárias: “a despeito desses problemas, dessas dificuldades, nós vamos continuar avançando positivamente. Para isso há um papel imprescindível, primordial e fundamental do Fisco, que é responsável pela tributação, pelo dever cívico da educação tributária, é responsável pela extrafiscalidade e é responsável, fundamentalmente, por manter coeso um sistema tributário que sustenta a ação governamental e os diversos benefícios sociais que o Brasil ainda necessita.”

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